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Teorias das Altas Habilidades ou Superdotação

Explorando os Múltiplos Modelos e Teorias das Altas Habilidades ou Superdotação

Os conceitos e abordagens relacionados à alta habilidade e superdotação são intrincados e multifacetados, o que torna a sua determinação uma tarefa complexa. Consequentemente, diversas perspectivas e critérios têm sido propostos para definir e identificar esses fenômenos. Não existe um modelo ou critério único e absoluto, pois diferentes aspectos precisam ser considerados, e cada abordagem oferece uma visão complementar do tema.

Nesse contexto, este texto busca introduzir alguns dos principais modelos e teorias desenvolvidos por renomados pesquisadores, como o Modelo de Dotação e Talento de Gagné, o Modelo de Dotação de Munique de Heller, o Modelo Tripartido sobre Altas Habilidades de Pfeiffer, o Modelo dos Três Anéis de Renzulli, e os estudos de Hollingworth e Dabrowski. Explorar essas diferentes perspectivas nos conduzirá a uma compreensão mais profunda do vasto universo das altas habilidades e superdotação.

Modelo de Dotação e Talento de Gagné (Gagné, 2003): Propõe que a superdotação é uma interação complexa entre habilidades inatas (dotação) e influências ambientais, e que o desenvolvimento do talento envolve a aprendizagem de habilidades específicas em diferentes áreas.

Modelo de Dotação Munique (Kurt A. Heller, 1927): Este modelo enfoca a importância de características biológicas, como a taxa de desenvolvimento neurológico, na identificação e desenvolvimento de indivíduos superdotados.

Modelo Tripartido Reinterpretado (Steven Pfeiffer, 2003): Pfeiffer reinterpreta o Modelo Tripartido de Renzulli, enfatizando a importância do ambiente familiar, cultural e social no desenvolvimento do talento.

O Conceito dos Três Círculos (Joseph Renzulli, 1978): Renzulli propõe que a superdotação é uma interseção entre alta habilidade, criatividade e envolvimento com a tarefa, sugerindo que os indivíduos superdotados exibem capacidades excepcionais nessas áreas.

Análise Inspirada em Leta Stetter HollingworthLeta Stetter Hollingworth foi uma pioneira na pesquisa sobre superdotação, destacando a influência crucial do ambiente educacional e do apoio emocional no desenvolvimento de indivíduos superdotados. Sua teoria enfatiza a necessidade de um ambiente educacional enriquecedor, que desafie intelectualmente os alunos superdotados por meio de oportunidades de aprendizado avançado e currículos adaptados às suas necessidades. Além disso, ressalta a importância do apoio emocional, reconhecendo e valorizando suas habilidades únicas para promover uma autoconfiança saudável e o desenvolvimento da identidade. Hollingworth contribuiu significativamente para a compreensão da superdotação, durante sua pesquisa realizada entre as décadas de 1910 e 1940.

A Doutrina da Fragmentação Construtiva e a "Overexcitability" por Kazimierz Dabrowski : Kazimierz Dabrowski desenvolveu sua teoria ao longo do século XX, com destaque a partir da década de 1960. Ele propõe que a superdotação está ligada a uma sensibilidade aumentada e um desenvolvimento psicológico diferenciado, resultando em uma "overexcitability". Esta intensidade emocional, sensorial, intelectual e imaginativa pode levar a uma maior consciência e autoconhecimento. Dabrowski publicou muitos de seus trabalhos e conceitos-chave durante as décadas de 1960 e 1970.

O Conceito Amplo de Talento por Abraham TannenbaumAbraham Tannenbaum, um psicólogo educacional cujo trabalho estava em destaque nas décadas de 1970 e 1980, elaborou um conceito amplo de talento. Ele argumentou que o talento não se limita a realizações acadêmicas, mas abrange uma variedade de áreas, incluindo habilidades artísticas, atléticas e interpessoais. Tannenbaum enfatizou a importância de reconhecer e nutrir talentos em todas as esferas da vida.

À medida que mergulhamos nos diversos modelos e teorias que cercam a superdotação, torna-se evidente que o desenvolvimento do talento excepcional é um processo intrincado, moldado pela interação entre fatores biológicos, ambientais e psicológicos. Desde as primeiras teorias de Hollingworth até os conceitos contemporâneos de Dabrowski e Pfeiffer, a pesquisa nesta área tem ampliado nossa compreensão sobre o potencial humano. Ao reconhecer a importância do ambiente educacional, do apoio emocional e da sensibilidade diferenciada, podemos promover um desenvolvimento mais completo e satisfatório para os indivíduos superdotados em todas as esferas da vida. Nos próximos segmentos, examinaremos cada modelo em detalhes, explorando suas contribuições para o campo da educação e psicologia.

Explorando o Potencial Humano: O Modelo de Dotação e Talento de Gagné

Françoys Gagné destaca a distinção entre superdotação e talento, ressaltando que a primeira se refere à posse inata de habilidades excepcionais, enquanto o segundo diz respeito ao notável desempenho resultante do desenvolvimento sistemático dessas habilidades.

Enquanto a superdotação é inerente e independente do ambiente, o talento é moldado pela interação com o meio, incluindo fatores familiares, educacionais e sociais. Em outras palavras, embora a superdotação exista independentemente das condições externas, o talento necessita de um ambiente propício para se manifestar plenamente.

Gagné concebe a superdotação como um processo de maturação, enquanto o talento é fruto do desenvolvimento das habilidades associadas a essa maturação. Este modelo abarca diversas áreas, incluindo intelectual, criativa, socioafetiva e sensorial-motora, e reconhece a influência das características individuais e do ambiente social na expressão do talento.

Embora pareçam conceitos distintos, dotação e talento estão intrinsecamente interligados, com o ambiente desempenhando um papel crucial na manifestação do potencial humano. O Modelo de Dotação e Talento de Gagné destaca a importância de oferecer condições favoráveis não apenas para os indivíduos superdotados, mas para todos, visando o desenvolvimento do talento em todas as crianças e jovens.

Desvendando Dificuldades e Talentos: Uma Abordagem Abrangente para Identificação

Segundo Gagné, a identificação requer uma variedade de ferramentas, incluindo a avaliação de educadores, testes padronizados e outras fontes de informação. Ele destaca que os educadores são fundamentais nesse processo, pois estão diretamente envolvidos no cotidiano do ensino e da aprendizagem.

Além disso, Gagné ressalta a importância de testes de inteligência, avaliações de criatividade, motivação, personalidade, clima escolar e familiar, bem como outros aspectos ambientais, como complementos cruciais na obtenção de informações sobre o desenvolvimento do indivíduo (vale ressaltar que Gagné enfatiza o desenvolvimento). No processo de identificação, é essencial considerar não apenas os educadores, mas também os pais, os colegas da criança e o próprio indivíduo.

Referências

GAGNÉ, Françoys. The DMGT: Changes Within, Beneath and Beyond. Talent Development and Excellence, v.5, n.1, pp. 5-19, 2013. 

FREITAS, Márcia F.R.L.; SCHELINI, Patricia W. Escala de Identificação de Dotação e Talento: construção de instrumento e validação de conteúdo. Interação em Psicologia, v.22, n.8, 2018, p.114-122. 

Abordagem Integral na Identificação de Talentos: O Modelo de Munique em Destaque

O Paradigma de Munique, concebido por Kurt Heller, segue a abordagem de Gagné e advoga pela inclusão de elementos muitas vezes negligenciados pelas avaliações padronizadas convencionais.

Estes elementos abarcam as particularidades individuais não cognitivas, como traços de personalidade, e os fatores ambientais, denominados moderadores, que moldam o desenvolvimento do talento. A teoria destaca a importância tanto dos preditores quanto dos moderadores. Os preditores incluem sete dimensões: habilidades intelectuais, criatividade, competência social, inteligência prática, aptidões artísticas, musicalidade e habilidades psicomotoras.

Esses fatores do talento estão intrinsecamente ligados às características não cognitivas, como motivação, estratégias de aprendizado e trabalho, controle da ansiedade, expectativas de controle e mecanismos de enfrentamento, assim como às condições ambientais, como o ambiente familiar de aprendizado, dinâmica familiar, qualidade do ensino, clima na sala de aula e desafios evolutivos. As interações entre todos os preditores e moderadores resultam em uma ampla diversidade de talentos.

A Identificação de Talentos no Paradigma de Munique

Este modelo sustenta que o talento é um construto multifacetado e que uma identificação eficaz baseia-se em abordagens multidimensionais. Isso implica que a identificação resulta da combinação de duas perspectivas: o paradigma psicométrico e o paradigma da expertise.

O paradigma psicométrico concentra-se no potencial individual, que pode ser avaliado por meio de instrumentos diagnósticos, como testes de QI. Por outro lado, o paradigma da expertise considera a personalidade (motivação e métodos de aprendizado) e o contexto social e cultural do indivíduo, minimizando a ênfase na inteligência.

Entretanto, um modelo multidimensional como o Paradigma de Munique busca integrar ambas as perspectivas, requerendo que a identificação leve em consideração o maior número possível de fatores. O processo de identificação envolve as seguintes etapas:

Triagem da população escolar: Todos os alunos preenchem questionários específicos, assim como seus professores e pais, enquanto especialistas observam os alunos na escola.

Avaliação de preditores e moderadores: Os alunos identificados como potencialmente talentosos são submetidos a testes e questionários.

Avaliação individual: Os alunos passam por uma avaliação mais detalhada para serem encaminhados a programas de atendimento especializado.

Este processo de avaliação deve ser realizado durante o Ensino Fundamental e requer programas destinados a receber os alunos identificados.

​​Referências

HELLER, Kurt A. Identification of Gifted and Talented Students. Psychology Science, v.46, n.3, p.302-323, 2004. 

FREITAS, Márcia F.R.L.; SCHELINI, Patricia W. Escala de Identificação de Dotação e Talento: construção de instrumento e validação de conteúdo. Interação em Psicologia, v.22, n.8, p.114-122, 2018. 

FREITAS, Márcia F.R.L.; SCHELINI, Patricia W. PÉREZ, Edgardo R. Escala de Identificação de Dotação e Talento: estrutura e consistência internas. Psico-USF, v.22, n.3, p.473-484, 2017. 


O Conceito dos Três Círculos

O conceito dos três círculos foi concebido por Joseph Renzulli como parte de um programa de intervenção destinado a desenvolver tanto o potencial acadêmico quanto o criativo-produtivo. Ele se fundamenta em três conjuntos principais de características, que são:

  1. Talentos acima da média (que não são necessariamente avaliados por testes de inteligência).
  2. Dedicação à tarefa
  3. Criatividade (e sua influência direta em diversas áreas do desempenho humano).

Os talentos acima da média referem-se tanto a habilidades mais amplas, como raciocínio verbal, numérico ou espacial, ou gestão da memória, quanto a áreas específicas de desempenho humano, como química, dança, composição musical ou desenho. O círculo dos talentos acima da média é o mais estável ao longo do tempo. Isso significa que o desempenho de um estudante dentro dos parâmetros deste círculo é relativamente consistente ao longo do tempo. Este círculo também está mais relacionado com os traços cognitivos tradicionalmente avaliados por testes. É importante destacar que não há uma relação direta entre habilidade acadêmica/intelectual e sucesso profissional, pois o sucesso na vida real também depende de outros fatores não cognitivos relacionados a traços pessoais e volitivos.

A dedicação à tarefa é um conjunto de características não intelectuais consistentemente evidenciadas por pessoas especialmente criativas e produtivas. Exemplos dessas características incluem perseverança, determinação, força de vontade e energia positiva. Essencialmente, isso se resume a uma motivação refinada e concentrada, uma energia direcionada para resolver um problema ou dominar um campo. Um dos principais fatores entre pessoas que contribuíram significativamente em suas áreas de atuação é sua capacidade de se dedicar plenamente a um problema por longos períodos e perseverar diante das dificuldades que surgem, o que pode desencorajar os outros.

A criatividade é um conjunto de características que engloba curiosidade, originalidade, generosidade e/ou uma propensão para questionar tradições ou convenções sociais. Enquanto o nível de desempenho valorizado por testes psicométricos tradicionais tende a ser constante ao longo do tempo, a dedicação à tarefa e a criatividade nem sempre são consistentes. Elas podem surgir e desaparecer dependendo do contexto e das circunstâncias, que são moldadas pelas experiências, incluindo as educacionais, que promovem o desenvolvimento desses traços. Ao contrário dos traços do círculo de talentos acima da média, a dedicação à tarefa e a criatividade são desenvolvidas a partir de experiências que as incentivam. Em muitos casos, a criatividade e a dedicação à tarefa se alimentam mutuamente.

O conceito dos três círculos se baseia na interação desses três conjuntos de características, que criam condições para a manifestação do que Renzulli chama de comportamentos dotados. Este conceito não concebe a alta habilidade intelectual como uma característica absoluta e estável, mas sim como um conjunto de comportamentos desenvolvidos dentro de um contexto de resolução de problemas. Renzulli considera que a função mais importante da educação é proporcionar oportunidades e recursos para que crianças e jovens possam gerar ideias criativas e desenvolver as habilidades necessárias para persistir no desenvolvimento dessas ideias.


A Identificação: O Pool de Talentos

O pool de talentos é um elemento-chave no sistema de identificação. Ele se concentra em identificar estudantes não apenas por meio de testes de inteligência tradicionais. O pool de talentos abrange um sistema que identifica estudantes que se destacam em testes de inteligência, aqueles que demonstram potencial de maneira diferente e aqueles que têm alto potencial acadêmico, mas que atualmente estão aquém de seu potencial. 

É um sistema de identificação multidimensional, que vai além da aplicação de testes de inteligência e medidas cognitivas. O pool de talentos utiliza diferentes critérios de identificação e avaliação, como desempenho acadêmico, testes de inteligência não verbal, recomendações de professores através de questionários, recomendações de pais e colegas, produções dos estudantes e estudos de caso, quando necessário. Esse processo é conduzido por uma equipe multidisciplinar dentro da escola.

Referência

RENZULLI, Joseph. Un sistema multicriterial para la identificación del alumnado de alto rendimiento y de alta capacidad creativo-productiva. Revista de Educación, ano 2015, n.368, p.96-117, 2015. 

Reflexões sobre os Desafios Socioemocionais das Crianças Superdotadas

Uma Análise Inspirada em Leta Stetter Hollingworth.

Leta Stetter Hollingworth (1886-1939) foi uma pioneira na investigação e assistência às crianças e adolescentes com AH/SD. Seu foco principal residia nas dimensões socioemocionais associadas à inteligência excepcional, além das questões de gênero. Ela também foi responsável pela fundação das primeiras salas de recursos para AH/SD, dedicando-se exclusivamente ao público infantojuvenil.

Hollingworth concentrou-se nos desafios de ajustamento únicos enfrentados por crianças superdotadas. Através de suas obras, ofereceu insights sobre a natureza desses desafios, seu impacto em diferentes níveis de habilidade e propôs soluções ainda relevantes nos dias de hoje.

Quais são os desafios específicos de ajustamento enfrentados pelas crianças superdotadas?

Hollingworth nutria um profundo interesse pela psique das crianças superdotadas, buscando compreender cada experiência individual. Ela rejeitava a ideia de que a vida de um indivíduo pudesse ser resumida por estatísticas médias, optando por adotar o método de estudo de caso em suas pesquisas. Além disso, desenvolveu uma técnica de análise de registros fotográficos, a fim de aprofundar sua compreensão sobre essas crianças. Para ela, compreender as crianças superdotadas era fundamental para oferecer-lhes o apoio necessário.

Aspectos singulares da vida das crianças superdotadas

Hollingworth argumentava que a sociedade tendia a negligenciar as crianças superdotadas por não apresentarem problemas sociais evidentes. Enquanto muitos pesquisadores da época destacavam a estabilidade emocional dessas crianças em relação à média, Hollingworth interpretava tal estabilidade como um sintoma de tédio, observando características como impaciência e necessidade de comunicação como indicativos de uma mente fértil.

Ela também notou que a precocidade exacerbava os desafios de ajustamento social, especialmente quando uma criança demonstrava uma mentalidade mais avançada do que sua idade cronológica indicava. Hollingworth defendia a necessidade de uma educação emocional para auxiliar essas crianças desde cedo, listando onze questões específicas que elas enfrentavam.

Hollingworth abordou diversas dessas questões:

A questão do ajustamento com os colegas de escola : Ela destacou que a aceleração acadêmica poderia criar situações sociais delicadas, especialmente para crianças superdotadas com QIs significativamente elevados. O descompasso entre idade e habilidade podia gerar inveja e bullying por parte de colegas mais velhos e fisicamente mais desenvolvidos.

A questão da falta de pares intelectualmente compatíveis : Hollingworth observou a dificuldade das crianças superdotadas em encontrar amigos com interesses e habilidades similares, o que poderia resultar em solidão e isolamento.

A questão do isolamento social : Ela expressou preocupação com o isolamento psicológico das crianças superdotadas, ressaltando que a consciência aguçada podia aumentar o risco de alienação social.

Esses são apenas alguns aspectos abordados por Hollingworth em sua análise das questões socioemocionais das crianças superdotadas, revelando sua profunda compreensão das complexidades enfrentadas por esse grupo único de indivíduos.

Referência  

SILVERMANN, Linda. Social and emotional education of the gifted: the discoveries of Leta Hollingworth. Roeper Review, v.12, n.3, p.171-186, 1990. 

A Doutrina da Fragmentação Construtiva e AH/SD por Kazimierz Dabrowski

Nos últimos vinte anos, a Doutrina da Fragmentação Construtiva (DFC) de Dabrowski tem sido alvo de numerosos empreendimentos investigativos no âmbito das AH/SD. A maior parte dos estudos concentrou-se na sobre-estimulação (TILLIER, 2009). 

Kazimierz Dabrowski, psiquiatra e psicólogo polonês, foi o criador da DFC, uma teoria que sustenta que o desenvolvimento é uma consequência do grau de organização. A dimensão mais significativa do desenvolvimento humano é a emocional, contudo, distingue-se do desenvolvimento neuromuscular ou cognitivo. A evolução do funcionamento emocional não é um processo automático, mas sim uma evolução dependente de outras condições.

Um elevado nível de funcionamento cognitivo não assegura um nível equivalente de funcionamento emocional, porém o inverso é verdadeiro, ou seja, um elevado nível de desenvolvimento emocional promove um elevado nível de desenvolvimento intelectual. O conceito de personalidade multinível é o ponto de partida para a análise do desenvolvimento e comportamento. Em termos gerais, os níveis mais elevados de desenvolvimento são caracterizados por processos mentais e comportamentais mais conscientes e voluntários, enquanto os níveis inferiores são caracterizados por processos mais mecânicos e automáticos. Dabrowski postulou cinco níveis de desenvolvimento da personalidade, e para transitar de um nível para outro, é necessário que ocorra uma desintegração do nível anterior, o que ele denominou de fragmentação construtiva.

A fragmentação construtiva é o processo pelo qual ocorre a transição de um nível inferior para um superior de funcionamento da personalidade. Consiste na enfraquecimento e dissolução de uma estrutura mental de nível inferior e suas funções, seguido pelo gradual surgimento e crescimento de um nível superior de funções mentais, culminando em uma personalidade integrada em um nível mais elevado. Este processo de desenvolvimento, do nível mais baixo para o mais alto do funcionamento mental, é caracterizado por conflitos, instabilidade e desorganização parcial ou completa do comportamento, seguido pelo gradual emergir e organizar de uma nova estrutura mental, a qual é superior à anterior.

A relevância da DFC nas AH/SD reside em suas contribuições para a compreensão do desenvolvimento humano, abarcando situações que podem ocorrer com as pessoas desde a infância até a idade avançada. Diversos eventos que afetam as pessoas com AH/SD são comumente e erroneamente interpretados devido à falta de conhecimento sobre seu desenvolvimento emocional. Um exemplo disso é a presença da ansiedade, geralmente vista como algo negativo, mas que, na realidade, muitas vezes representa o próprio processo de desenvolvimento, exigindo atenção e intervenção adequadas por parte da família e escola, especialmente em crianças e adolescentes. A ansiedade é uma das expressões primárias do desenvolvimento da personalidade e indica que a pessoa está passando por um processo interno de fragmentação.

Essas fragmentações são impulsionadas por fatores internos, como a sobre-estimulação emocional, que é um dos principais motores desse processo. As fragmentações geram diversas manifestações e expressões comportamentais e emocionais que são facilmente confundidas com transtornos psiquiátricos. Muitas pessoas com AH/SD são vistas pelos outros como portadoras de alguma patologia, quando na verdade estão passando por seu próprio processo de desenvolvimento, permeado por crises e conflitos. Para Dabrowski, crise é sinônimo de desenvolvimento. As próprias pessoas com AH/SD podem acreditar que têm algum distúrbio, que estão ficando "loucas", pois os processos de fragmentação fazem com que ocorra uma diferenciação do que é considerado "normal".

No que diz respeito às pessoas com AH/SD, Dabrowski observou que elas geralmente apresentam sobre-estimulação emocional, o tipo de sobre-estimulação que amplifica as outras formas e atua como um impulsionador do desenvolvimento da personalidade. Isso significa que essa perspectiva nos ajuda a compreender características comuns das pessoas com AH/SD, como sua intensidade e profundidade intelectual, sensorial, imaginativa e/ou psicomotora, seus processos que envolvem crises e conflitos e como podemos promover seu desenvolvimento desde o nascimento.

Nota :

TILLIER, Wiliam. Dabrowski Without the Theory of Positive Disintegration Just Isn’t Dabrowski. Roeper Review, v.31, pp. 123–126, 2009. 

Sugestão de leitura inicial: OLIVEIRA, Juliana C.; BARBOSA, Altemir J.G.; ALENCAR, Eunice M.L.S. Contribuições da Teoria da Desintegração Positiva para a Área de Superdotação. Psicologia: Teoria e Pesquisa, v.33, pp. 1-9, 2015. 

O Conceito Amplo de Talento por Abraham Tannenbaum

Abraham Tannenbaum ampliou a visão de talento além dos aspectos meramente intelectuais ou acadêmicos. Para ele, talento é a capacidade de criar algo que enriqueça diversos aspectos da vida humana, como moral, físico, emocional, social, intelectual ou estético. Ele argumenta que nem todas as crianças talentosas atingem seu potencial máximo na infância e adolescência, sendo necessário considerá-las como potencialmente talentosas nessa fase do desenvolvimento, pois o verdadeiro talento se revela mais tarde na vida adulta, através de desempenho excepcional, contribuições à sociedade ou criação de ideias transformadoras.

Tannenbaum defende que as crianças com habilidades excepcionais devem ser expostas a uma ampla gama de experiências durante seu crescimento para maximizar suas oportunidades de desenvolvimento. Essa abordagem exigiria mudanças substanciais na educação dessas crianças, com foco no enriquecimento do aprendizado para todos e na identificação daqueles que se beneficiariam mais. Seu modelo, conhecido como Estrela Marinha, considera não apenas traços intelectuais, mas também fatores como motivação, comprometimento, autoconfiança e bem-estar mental como componentes essenciais do talento potencial.

Além disso, Tannenbaum reconhece o papel da sorte no desenvolvimento do potencial das crianças talentosas, enfatizando a importância de experiências como mentoria, desafios significativos e oportunidades ao longo da infância e adolescência, além das características inatas de inteligência e trabalho árduo.

Referência:

BLUMEN, Sheyla. In Memoriam. Revista de Psicologia, v.33, n.1, 2015, pp. 1-4. 


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